Eu queria ser uma dessas pessoas que continuam, sabe? Dessas que nunca olham pra trás, que despem-se das dores, dos sorrisos, das companhias e simplesmente seguem em frente. Que não se dividem, não se despedaçam, não carregam nem deixam marcas, talvez, apenas pequenos arranhões, que sacodem a areia do corpo, ajeitam o cabelo, levantam a cabeça e tomam uma única direção.
Gente que sente sozinho e chora baixinho. Que não gasta os sentimentos, não se expõe, simplesmente retoma sua vida, com serenidade e maturidade, que até convence que está tudo bem e que cada tijolo de sua estrutura emocional está no mesmo lugar, inabalável.
Sempre fui do tipo que colocava pra fora tudo o que bagunçava por dentro, principalmente o coração. Sem discrições, sem prolongar, perdendo qualquer possível chance de um jogo de conquista, entregando os pontos na primeira rodada, antes do "cara ou coroa", antes de cantar o hino, enfim...
Mas é que sempre tive a sensação de que, quem esconde muito o que sente, sufoca nas próprias palavras, se afoga nas emoções e, o pior de tudo, não vive! Eu sempre tive pavor de morrer por fora, sem ao menos ter nascido por dentro, sempre temí me tornar racional demais, sem nunca ter sentido a loucura da paixão dançando e percorrendo nas minhas veias, de desconhecer os altos picos dos meus batimentos cardíacos, quando um cheiro excitasse minhas lembranças, de não conseguir esboçar empatia alguma, de não sentir a saudade apertar, de não saber o valor da presença, depois de descobrir o vazio da ausência, de não poder contar nos dedos as vezes que arrepiei com o toque das mãos, de sentir frio no coração, invés de sentir na barriga, de não sentir. Eu tenho pavor de não sentir.
Já recebi metades e retalhos de sentimentos, mas nunca soube não me doar por inteiro, não me doer, não ser. Sempre fui carregada pelas pessoas que carreguei no peito. Sempre fui dos extremos. Sempre fiquei pelo caminho, sem step. Sempre intensa, sempre "in tensa", sempre preocupando, sempre "pré-ocupando". Eu sou inteira entrega, todas as horas, todos os dias, mas às vezes queria ser um pouco só minha, apesar de gostar de emaranhar nas histórias dos outros. Eu sempre quis ter medidas e saber escondê-las. Eu só não quero ser essa gente muda, que não muda a expressão do rosto, que não sabe o que é chorar pra depois sorrir. Essa gente que não fica em ninguém, que sempre vai. Essa gente que pensa que está vivendo, mas ainda não se deu conta que está morrendo. Morreu faz tempo, aliás, nunca viveu.